Internação por síndromes respiratórias é seis vezes maior que em 2019


Um levantamento da plataforma InfoGripe, da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), revela um aumento expressivo nas internações com quadro para Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG), neste ano, no Ceará, quando comparadas aos dados dos últimos quatro anos. Em relação a 2019, os números são 6,5 vezes maiores. No ano passado, até o dia 25 de abril, foram 357 hospitalizações; no mesmo período de 2020, o número cresceu para 2.312. Especialistas atribuem o fato à Covid-19, que se somou às doenças provocadas por outros vírus respiratórios.

Os números superam os totais de notificações de anos anteriores, conforme levantamento do Núcleo de Dados do Sistema Verdes Mares. Em relação às internações de pacientes com confirmação laboratorial por SRAG, os números saltaram de 166 em 2019 para 616 neste ano, refletindo aumento de 271%. Quando comparados às 54 confirmações de 2017, por exemplo, o aumento é de mais de 11 vezes. Mesmo em 2016, quando houve um surto de Influenza A (H1N1), foram registrados apenas 27 casos.

Para realizar a conta, o InfoGripe se baseia nos casos de SRAG reportados ao Sivep-gripe, sistema do Ministério da Saúde. No comparativo com outros Estados, o Ceará ocupa atualmente a quinta posição no Brasil e a primeira do Nordeste em número de hospitalizações. A Fiocruz alerta que, embora a notificação seja obrigatória para unidades de saúde, “historicamente existe uma atraso na inserção de dados, especialmente em momentos de surtos”.

A SRAG é uma doença respiratória grave que exige internação e é causada por vírus. Conforme a série histórica da Secretaria da Saúde do Ceará (Sesa), ela é mais comum nos primeiros meses do ano, que coincidem com o período mais chuvoso no Estado. Contudo, na observação do biólogo Gabriel Aguiar, mestrando em Ecologia e Recursos Naturais pela Universidade Federal do Ceará (UFC), ainda é “muito cedo” para apontar com clareza algum comportamento sazonal da Covid-19.

“Não temos ainda tempo de observação do vírus que nos permita monitorar como ele responde à sazonalidade. Parece haver uma modesta tendência de menor transmissão do vírus em climas tropicais, mas essa redução quase certamente não é considerável em comparação, por exemplo, à de medidas de isolamento. Não é razoável contar com o clima para prevenção e controle”, explica Alencar. Até agora, no Ceará, o novo coronavírus já matou 794 pessoas, em meio a 11.470 contaminados.

Para Gabriel, se a Covid-19 tivesse chegado ao Estado no segundo semestre, que tende a ser mais seco, a situação poderia ser a mesma ou “bastante semelhante”.

“Aqui no Ceará, por exemplo, temos valores de temperatura elevados o ano inteiro, e em Fortaleza, o epicentro da pandemia, temos elevada umidade em todos os meses”, aponta Gabriel Alencar
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Causas

O predomínio cada vez maior do novo coronavírus entre os casos e óbitos por SRAG é outro fator de destaque, segundo os pesquisadores da Fiocruz. Em 2020, das 616 hospitalizações confirmadas por SRAG, 488 foram por Sars-CoV-2; outras 51 ocorreram por influenza e 17 pelo vírus sincicial respiratório (VSR). No ano anterior, no mesmo período, quando o novo coronavírus ainda não havia sido descoberto, foram 91 hospitalizações por influenza e 69 pelo VSR.

O último boletim epidemiológico da Covid-19 da Sesa confirma que o Sars-Cov-2 tem força nas hospitalizações no Estado. “O coronavírus representa 81,1% de todos os casos de SRAG que tiveram etiologia esclarecida”, indica o documento técnico, com base nos dados até 28 de abril. Na sequência, vieram outros vírus respiratórios (como rinovírus e adenovírus), com 10% dos casos hospitalizados, e a influenza, com 8%.

Os dados da Sesa também apontam que, até aquela data, 52% dos pacientes com SRAG no Ceará eram idosos com 60 anos ou mais, e 81% tinham alguma doença crônica. Os pesquisadores da Fiocruz notaram uma mudança no perfil dos pacientes: no ano passado, as doenças respiratórias graves afetaram principalmente crianças, mas os casos de 2020 acometem mais idosos e pessoas com comorbidades, uma característica da Covid-19.

Outro dado relevante do InfoGripe é que apenas 26% das internações no Ceará, até 25 de abril, tiveram a causa esclarecida. Quase mil pacientes aguardavam diagnóstico de exames. A demora na liberação dos resultados e a subnotificação de outros casos chama atenção porque, segundo o biólogo Gabriel Aguiar, os epidemiologistas ficam bem mais limitados para realizar previsões sobre a pandemia do novo coronavírus e determinar seus reais impactos na área da saúde.

“Precisamos desses dados para saber alocar recursos humanos e financeiros, para atingir o máximo de precisão em instituir planos de contenção. Encarar uma doença desse tipo sem dados epidemiológicos é planejar uma batalha às cegas. Precisamos saber como, onde e quando a doença ataca”, sinaliza Gabriel.
Isolamento

Na prática, o aumento de casos de SRAG pressiona a rede hospitalar por estrutura de internação. Embora tenha aberto mais de mil leitos exclusivos para Covid-19 em menos de dois meses, o Governo do Estado sente os efeitos do aumento da demanda. Nessa terça, a Sesa informou que a taxa de ocupação dos leitos específicos de Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) era de 96% na região de Fortaleza e 93% no Estado.

Analisando o cenário, o boletim InfoGripe recomenda “a necessidade de manutenção das recomendações de isolamento social para evitar demanda hospitalar acima da capacidade de atendimento”. A Fiocruz ressalta que a saturação da rede hospitalar, já relatada em alguns Estados, “também pode afetar os dados e a taxa de crescimento dos casos notificados nas próximas semanas, uma vez que as notificações dependem de hospitalização”.

“Em uma pandemia em que milhões são contaminados, uma morte a cada 100 infectados é muita coisa. Aqui no Brasil, cada pessoa infectada transmite para outras duas ou três, e há muitas pessoas assintomáticas ou pré-sintomáticas transmitindo. Por isso o isolamento é tão importante”, reforça o biólogo Gabriel Aguiar. A decisão com medidas restritivas foi prorrogada pelo governador Camilo Santana até o dia 20 de maio, quando completa dois meses.

Foto:Fabiane de paula

Fonte: Diário do Nordeste

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