Túnel subterrâneo poderia ter evitado rompimento


A causa principal do que gerou a sobrepressão para o rompimento do túnel adutor na barragem de Jati ainda é incerta, embora fontes do Ministério do Desenvolvimento Regional apontem movimentação na válvula como a mais provável desencadeadora do restante. As inspeções na casa de válvula ainda não foram feitas (a área ainda está inundada), mas uma pergunta movimenta diversos engenheiros dentro e fora das obras de recuperação: apesar da possível falha na válvula, o sistema não deveria ter suportado?
A barragem de Jati foi construída para o porte de uma usina hidrelétrica. É o que está como segunda etapa do projeto, com uma data a perder de vista, ainda mais pelo atraso da conclusão da primeira etapa.

No projeto inicial, anterior à sua construção em 2016 (a barragem já estava feita), o túnel adutor seria construído de modo completamente subterrâneo, escavado na rocha e revestido por concreto. Do lado de fora, a tubulação de aço, conforme executada.
Relatórios de projetos executivos da obra obtidos pela reportagem, a partir da análise de engenheiros consultores do Projeto de Integração do Rio São Francisco, revelam o entendimento para aproveitar apenas parte de escavação ficando parte do concreto exposto, o que traria praticidade, em virtude da topografia e da concepção rochosa – seria necessário escavar a rocha e em todo seu interior fazer o revestimento de concreto.
“Foi um entendimento da época, de que o duto externo seria mais executável e até menos oneroso”, admitiu um engenheiro do Ministério do Desenvolvimento Regional, que pediu para não se identificar.

Especialistas ouvidos pela reportagem apontam que a sobrepressão causada pelo possível fechamento, depois abertura, da válvula, pode não explicar sozinha o rompimento.

“É possível ver pelas imagens que a ruptura aconteceu na área de uma das juntas do concreto. Aquela junta de dilatação é um material de borracha, comum no encaixe de qualquer obra como aquela. Um provável desgaste dessa junta, acentuado pelo tempo de exposição sem água, pode ter contribuído para que o sistema não suportasse a pressão em que a energia cinética da água foi transformada com a interrupção pela válvula”, explica Roberto Kachel, professor doutor em engenharia hidráulica e saneamento pela Universidade de São Paulo que analisou vídeos, imagens e relatos a partir do rompimento do túnel adutor de concreto.

Uma explicação doméstica para o golpe de ariete da engenharia pode ser exemplificada com uma mangueira de alta pressão regando as plantas de um jardim. Se a válvula da mangueira é fechada abruptamente, sob uma forte pressão de água vindo da torneira, a mangueira se move sozinha, respondendo à pressão. Se a interrupção é feita diversas vezes, essa energia segue pressionando as paredes da mangueira.
Para Kachel, o regime transiente (outro nome para o golpe de ariete) é essa ida e vinda, hora de onda de baixa pressão, hora de alta. “Quando vem uma de alta pressão, vai quebrando o concreto. Num minuto ou menos quebra tudo e abre um buraco. Será necessário avaliar se houve falha de operação, alguém fechando indevidamente a válvula, se foi algum dispositivo no projeto ou algum pequeno detalhe na construção”.

O professor sugere que, pela grandiosidade da obra, que deverá receber uma hidrelétrica, seria necessário no túnel adutor uma “chaminé de equilíbrio”, que seria capaz de conter a enorme onda de pressão gerada pela energia de velocidade da água.

Aço x concreto

O coordenador de obras e fiscalização do Ministério do Desenvolvimento Regional, Tiago Portela, que comanda a recuperação na obra, admitiu que uma chaminé de equilíbrio é uma hipótese a ser discutida quando da recuperação do túnel. Sempre cauteloso, o engenheiro prefere esperar a inspeção para dizer o que poderá ser feito. Mas admitiu também a possibilidade de uma tubulação de aço, em lugar do concreto, como uma medida maior de segurança.

Francisco Teixeira, secretário de Recursos Hídricos do Ceará e ex-ministro da Integração, também aponta linhas de apuração: “o que provocou isso pode ser falha de operação, construtiva ou de projeto, que pode não ter previsto algum intrumento para proteger quanto a isso. Mas uma obra dessa magnitude sempre é discutida com muito cuidado”, ponderou.
“(Quando ministro) deixei a parte da barragem pronta, e o sangradouro, o vertedouro de lado. Mas a tomada d’água é alimentação e energia foi feita depois. Mas o que soube é que lá tem a válvula dispersora, e antes dela uma válvula de controle, que abria e fechava”.
Até ontem a “casa de válvula” continuava completamente inundada. Só após evacuação de água haverá inspeção.

Foto: Kid Júnior

Fonte: Diário do Nordeste

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