“Nós lutamos muito mais para salvar famílias”, conta brigadista cearense sobre queimadas no Pantanal


De volta ao Ceará, na sede do Centro Nacional de Prevenção e Combate aos Incêndios Florestais (Prevfogo), em Quixeramobim, brigadistas que atuaram na operação para debelar o fogo no Pantanal, entre setembro e outubro deste ano, relataram ao Sistema Verdes Mares a rotina de trabalho na Estação Ecológica Serra das Araras, no Mato Grosso (MT), o dilema em deixar a família para uma missão trabalhosa e as preparações para operações em geral.

Pela primeira vez como chefe de brigada do Prevfogo/Ceará, o agente José Savio Lima conta que a Operação Pantanal, de início, deveria ser voltada à preservação da biodiversidade.

No entanto, na prática, a maior parte do trabalho foi em prol de vidas humanas. A experiência, segundo o líder, foi uma novidade para a equipe.
“Ao chegar lá, nós lutamos muito mais para salvar famílias do que a biodiversidade em si.

Chegou um momento que tivemos de decidir entre salvar a fauna e a flora e salvar as famílias em residências próximas que estavam sendo ameaçadas também. Felizmente, nós tivemos êxito nesse combate”, diz.

O chefe dos brigadistas explica que o principal problema do fogo próximo das famílias era a dificuldade respiratória.

“Nós usamos técnicas de combate, prevenindo que esse fogo se aproximasse das residências, não só pelo fato desse fogo queimar as casas, mas na verdade a poluição do ar mata muito mais do que o fogo em si”. 

A logística de acesso aos pontos de incêndio foi feita de forma tranquila, de acordo com o agente. “Usamos aeronaves e pela estrada tivemos acesso às comunidades quilombolas que a gente atendeu”.

Se comparado às outras operações, Sávio ressalta que o fogo se comporta de maneira diferente em diferentes biomas.

“Por se tratar de áreas bem maiores, a magnitude do incêndio também muda. A caatinga quando queima, por exemplo, geralmente ocorre por poucos dias, pois são áreas pequenas”, detalha. 

“Uma outra diferença é a quantidade de investimentos aplicados naquela operação, além do número de pessoas envolvidas para ter controle de tudo”.

Rotina

Há cerca de 11 anos em atuação como brigadista, a rotina desse cargo começa na preparação, diz o chefe de esquadrão do Prevfogo/Ceará, Sidney Bezerra de Albuquerque, que também atuou em prol do Pantanal. “Nós passamos por cronograma que contempla uma bateria de testes e exames de aptidões físicas para saber se suportamos os desafios dentro da própria brigada”. explica.

Além do treinamento físico, o que não pode faltar para a formação de um brigadista é a coragem de enfrentar o fogo, considera o agente. “É um processo muito delicado”.

Em relação à operação no Pantanal, o agente conta que, ao chegar na região, “nos deparamos com um cenário de destruição enorme”. 

“Perdemos algumas batalhas, como a destruição da fauna e da flora em si, mas no final da guerra saímos como vencedores. Nós trabalhamos muito bem nosso psicológico porque nem sempre vamos sair vitoriosos”, analisa.  
“No momento do combate, nós prezamos muito pela extinção do fogo, já o momento de descanso vem por último”.

“Quando recebemos uma missão pensamos que precisamos dar o nosso melhor. A gente se prepara tanto no físico quanto no psicológico para suportar a missão da melhor forma possível”, pontua Sidney.

Segundo o chefe Savio, durante qualquer operação, a jornada de trabalho depende do comportamento do fogo, “apesar da gente prezar por cumprir a jornada de trabalho de oito horas por dia. Quando é um local de difícil acesso, às vezes, é necessário acampar no mato mesmo”. No Mato Grosso, contudo, o trabalho foi, em sua maioria, diurno, com início da jornada às 6h e término às 18h/19h. 

Cerca de duas pessoas ficaram responsáveis para a logística de alimentação durante a atuação em campo, no Pantanal, segundo o agente.

“A alimentação e a água era preparada na própria Estação Ecológica e levada ao campo para não nos deslocarmos de volta à base”, comenta Savio.
Já o combate durante a noite é feito, principalmente, quando o combustível do incêndio é mais forte.

“O mato seco, por exemplo, não dá para trabalhar durante o dia pois é muito arriscado. Nesse caso, nós optamos por trabalhar durante a noite”.

Experiências

O chefe de esquadrão Sidney Bezerra também ajudou em operações como a contenção de óleo no litoral de Alagoas.

De Acopiara, o agente diz sentir muito a ausência dos filhos e da esposa em cada missão. “A gente fica triste pela falta dos familiares, nessa última operação foram 40 dias longe de casa, mas entendemos que é para um bem maior”, comenta.

O brigadista destaca a missão no Pantanal como uma das mais marcantes da suas carreira. “Tivemos algumas perdas, é verdade, mas demos o nosso melhor e a sensação é de dever cumprido”, relata.

Savio deixou os pais, com quem mora, para ir à campo no Pantanal neste ano. “É uma aflição pra mim, já que eu cuido deles, e é uma preocupação para eles também. Mas eu saio para uma jornada com a sensação de que eu tenho um grande objetivo, além dos meus pessoais”.

“Meu primeiro aprendizado foi atuar como chefe. Esse foi meu primeiro ano neste cargo. Foi tudo muito novo pra mim. Quem está de fora vê a minha posição de maneira muito artificial. Ser chefe de brigada não é somente delegar função e cobrar.

É tomar postura de líder ao lado dos colegas, vai além de qualquer ego ou vaidade do cargo. O bem coletivo prevalece. Foi uma experiência incrível pra mim”, ressalta Savio.

Foto: Prevfogo/CE

Fonte: Diário do Nordeste

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